Vazio legal

Minha filha, quando engatinhava só queria brincar de tirar protetor de tomadas. Não havia jeito. Eu dizia: Dá choque, choque dói... e ela repetia, enquanto mexia no protetor: Sók dói! Não adiantava oferecer outros brinquedos mais interessantes, resolvi dando um tapa de arder nas costas da mãozinha dela. Nunca mais tirou um protetor! Na época a palmada podia.
Uma criança do prédio, com cinco anos, filha de empregada, que morava com a mãe, correu de repente e atravessou a rua na frente de um carro, que graças a Deus conseguiu frear a tempo. A mãe desesperada, não podendo dar uma palmada na filha reagiu como pôde: se você fizer isso, eu vou embora e você nunca mais me vê. A menina caiu em uma choradeira convulsa. O medo de ficar abandonada foi, talvez, pior do que se tivesse levado uma palmada.
Fazer lei é fácil, difícil é atentar para todas as circunstâncias. Há o vazio legal. O que fazer, quando as condições não são aquelas previstas? Como pais, com pouca instrução e pouco poder de barganha vão educar os filhos? Ameaçar de abandono?
E caso, como aquele pai adulto, que correu em defesa do próprio filho, que estava levando um dedo no olho e bateu em criança de quatro anos. Disse que já tinha registrado inúmeras reclamações na escola e que esta nada tinha feito. Atitude desse pai, indubitavelmente errada, mas a situação permanece, no vazio legal. O que fazer com uma criança que comete bullying com outras, quando nenhuma estratégia funciona? A escola não podia afastar o aluno implicante, exigir que os pais dessem um jeito, esses também pouco poderiam fazer. Muitas vezes as penalidades previstas não funcionam, isso quando as inúmeras leis ainda permitem. Ir para o cantinho, ficar sem recreio, ficar depois da aula, fazer tarefas como castigo. 


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